quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Índice da felicidade não é para rir: é coisa séria

Por ter um toque de novidade, o direito à felicidade ainda dá margem a ironias. Principalmente no Brasil, onde ela passa a ser obrigação do Estado. Por Cláudio Carneiro

Não são poucos os que deixam escapar um sorriso quando ouvem falar num índice criado no longínquo Butão que mede a Felicidade Interna Bruta (FIB). Talvez por ter um toque de novidade, o direito à felicidade ainda dá margem a ironias e desconfianças — principalmente no Brasil, onde a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado aprovou, no dia 11 deste mês, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da Felicidade que altera a redação do artigo 6 que deverá incluir o vocábulo “felicidade” entre as obrigações do Estado de prover os direitos básicos de todos nós, cidadãos.

A nova redação — se aprovada em plenário — alterará uma única linha do artigo que diz “são direitos sociais, essenciais à busca pela felicidade, a saúde, a educação, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados”. Não cabe acreditar que todas as nossas tristezas serão varridas para bem longe, uma vez que a mesma constituição não nos assegura hospitais minimamente limpos e confortáveis, nossas escolas públicas vão de mal a pior, milhares de pessoas dormem em nossas ruas e a fome e o desemprego grassam sob nossos narizes.

Já estamos carecas de saber que o estado não cumpre sua parte de atender às demandas mínimas da população. Mas as políticas públicas precisam ter a felicidade como meta ou referência. Países desenvolvidos e instituições respeitadas perceberam a seriedade e a importância de perseguir a felicidade.

Ao avaliar a “riqueza” do país pelo FIB — e não pelo PIB — o pequeno, gelado e montanhoso país budista deu um salto em seus indicadores sociais, transformando-se num laboratório de gestão e gestação de um novo conceito de bem-estar. Embora o Canadá tenha sido o primeiro país ocidental a adotá-lo, o interesse pelo FIB corre o mundo e instituições como a ONU e o Banco Mundial estão interessados em torná-lo um índice internacional.

Dinheiro não traz felicidade?

Para muitos, a felicidade pode estar atrelada ao padrão econômico, mas a metodologia de medição do FIB é complexa e percorre a subjetividade do ser humano em questões como saúde cultural, emocional, mental e social e ainda espiritualidade, prazer e liberdade. Uma única entrevista para avaliar o FIB de um butanês pode durar oito horas.

O coordenador do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas foi um dos primeiros a se interessar pelo FIB no Brasil. No final de 2008, Marcelo Neri levantou — com base em pesquisa Gallup — que, numa escala de zero a dez, o brasileiro tem nota 8,78 no índice de felicidade futura. Somos mais felizes e otimistas que os dinamarqueses (8,51). Pior situação vive o Zimbábue (4,04). Para obter esses números foram feitas 150 mil entrevistas em 132 países.

Já no item felicidade atual, despencamos para a 22ª posição, com 6,77 pontos. Felizes são os dinamarqueses: 8,02. Ao apresentar os dados do estudo, Marcelo Neri comentou: “O dinheiro traz felicidade em boa medida. Se dobrar a renda, a felicidade cresce 15%”. Já a desigualdade é inversamente proporcional à felicidade. Mesmo considerando o trabalho inteiramente empírico, Neri avaliou que “diminuir a desigualdade na educação e proporcionar trabalho para o jovem pode influir no índice de felicidade futura”.

Presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais (Anadef), Luciano Borges lembra que países como Coreia do Sul, Estados Unidos e Japão reconhecem a felicidade como direito de cada cidadão e da sociedade e que, no caso coreano, é dever do estado assegurar essa prerrogativa. Em recente artigo, ele destaca que, no cenário brasileiro, o novo texto constitucional “pode reforçar o compromisso do Estado brasileiro com os valores mais caros à existência humana, daí a importância de estarem preservados por força constitucional, permitindo maior concretização ao princípio da dignidade da pessoa humana”.



Fonte:  http://opiniaoenoticia.com.br/

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